O ajuizamento de Ginástica
Muito se fala de ajuizamento/arbitragem, e muitas vezes por razões que nada tem a ver com o cerne da questão. O arbitro é sempre o “mau da fita”. Todos se sentem no direito de julgar a ação de quem julga, de quem avalia, de quem arbitra, na maior parte das vezes chega a ser de forma ofensiva e na minha opinião irresponsável por falta de conhecimento. Mais grave se torna quando tudo isto vem de quem tutela.
O público (os pais), que não vêm no resultado aquilo que é expectável para os seus filhos, ou seja “ser o melhor”; os treinadores que não vêm na avaliação final o resultado do seu empenho e dedicação; os dirigentes que acreditando ter feito a melhor opção na escolha dos seus técnicos, se recusam a fazer qualquer análise que não seja a de má arbitragem, quando os resultados não são os expectados; as próprias entidades que tutelam os juízes/árbitros que desatam a tecer comentários, mais ou menos ofensivos, mais ou menos públicos, chegando mesmo a punir, quando o resultado lhes parece diferente do que seria desejável para a concretização dos seus projetos. Na maioria das vezes todas estas opiniões recaem sobre fatores, que sendo válidos, na minha opinião não são os mais relevantes. A desonestidade por exemplo, é o primeiro “ataque” às juízes…prejudicou este e beneficiou aquele. Com certeza que se grande número dos árbitros/juízes fossem questionados sobre o seu grau de honestidade a resposta seria positiva.
Não há regra sem exceção, é certo, mas por norma trata-se de pessoas com carácter, com bom carácter, educadas, com boa formação, que tem filhos, que tem as suas profissões e que vivem o seu dia a dia de forma correta e honesta. Por que razão, seriam diferentes enquanto juízes….pergunto?
As juízes são pessoas, não são cronómetros acionados por sensores.
Dada a grande dificuldade de avaliar a execução do movimento em frações de segundo o ajuizamento na ginástica é feito por painéis de 2, 4 ou mais juízes, sendo que o próprio código de pontuação permite determinado afastamento entre as juízes, sem que isso seja considerado erro ou “tendenciosismo”.
De tanto que se fala….se fosse fácil já há muito que estaria resolvido. Não é de facto…mas há muito que se pode fazer.
Foram e são feitos estudos sobre esta temática, e são muitos os fatores que podem influenciar positiva ou negativamente a prestação das juízes em prova. Como exemplos, podemos referir o instrumento de avaliação (Código de Pontuação), que pode apresentar lacunas na definição do critério de avaliação; o tempo de competição em que é exigido à juiz elevados níveis de concentração durante grandes períodos de tempo; a experiência da Juiz; a capacidade de memorização da juiz; o angulo de visão da juiz; o efeito patriotismo e/ou clubismo; a relação de proximidade afetiva do avaliador e avaliado; etc, etc.
Se existem fatores que não podemos controlar diretamente, tais como o instrumento de avaliação, podemos e devemos controlar e evitar aqueles que nos são possíveis, e aqui a tutela tem muita responsabilidade (Não me refiro ao Conselho de Ajuizamento, porque este não tem autonomia nem poder decisório).
Em vez de gastar energias a acusar este ou aquele com análises em nada fundamentadas pelos regulamentos existentes, deve e pode promover formação, momentos de diálogo e de análise reflexiva entre as juízes antes e depois das provas, procurar aprender com a partilha de experiências e opiniões, recorrer a quem tem mais experiência dentro de cada especialidade. Procurar diminuir ou eliminar os fatores que influenciam negativamente a prestação da juiz, como criar mecanismos para que não seja possível assumir dois papeis em simultâneo no mesmo ano competitivo, eliminando a relação de proximidade afetiva, diminuindo os tempos de prova/atuação da juiz…
Alguém tem dúvida de que o treinador que acompanha a ginasta diariamente, cria laços de proximidade e afetividade, muitas vezes mais intensos do que com os próprios familiares? Não é “à toa” que a Constituição Portuguesa impede os familiares diretos de se avaliarem entre si – é preciso salvaguardar a imparcialidade, que comprovadamente fica comprometido quando o fator afeto é relevante.
Desengane-se quem julga que a responsabilidade está só do lado de lá! É preciso que os juízes, também assumam a sua parte… podem e devem ter a coragem de fazer opções, podem e devem ter a coragem de recusar convocatórias quando sabem que existem fatores que podem influenciar negativamente a sua prestação…podem e devem solicitar mais formação, podem e devem exigir que seja feita a avaliação reflexiva da aplicação dos regulamentos existentes. Podem e Devem!
...não chega olhar para lado e dizer que “ tudo está mal”, não chega comentar com o colega do lado esta ou aquela questão com a qual não concorda.
...claro que não é fácil…todos sabemos! Mas no Desporto para vencer é preciso muito esforço, muita dedicação e muito investimento… no ajuizamento desportivo não é diferente. Se é verdade que a justiça tem que ser de todos e não pode ser de cada um, não é menos verdade que não há líderes perfeitos, mas pior que isso é não haver líder…não haver rumo.
Podemos fazer melhor – é verdade!
Catarina Leandro
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